Livro de Reclamações: 16 anos depois, o que celebrar?
O decreto-lei nº 19/2008, de 9 de junho institui a obrigatoriedade de existência e disponibilização do livro de reclamações (LR) em todos os estabelecimentos de fornecimento de bens ou prestação de serviços, completou 16 anos, no dia 09 de junho de 2024.
Não há dúvidas que o LR é um instrumento indispensável para o bom funcionamento do mercado e do sistema de consumo em Cabo Verde, pois é o primeiro instrumento de resolução de conflito que o consumidor tem acesso, logo no local onde ocorreu o conflito e não tem custo, tornando mais acessível o exercício do direito de reclamar. É um instrumento por excelência para formalização da reclamação e obriga a entidade de controlo de mercado competente ou a entidade reguladora do sector a se posicionar. Funciona também como forma de fiscalizar o comportamento das empresas nas relações de consumo.
O LR tem como base a preocupação com um melhor exercício da cidadania através da exigência do respeito dos direitos dos consumidores e justifica-se com a necessidade de tornar mais célere a resolução de conflitos entre os consumidores e os agentes económicos, bem como de permitir a identificação, através de um formulário normalizado, de condutas contrárias à lei.
Para a ADECO, após 16 anos depois, o uso do LR na sociedade cabo-verdiana é decepcionante! Por um lado muitos consumidores desconhecem este instrumento, o que torna necessário uma maior sensibilização da parte do governo junto dos consumidores. Por outro lado, a falta de fiscalização das agências reguladoras e entidades responsáveis, bem como as respostas às reclamações, consideradas injustas para os consumidores, desmotivam aqueles que têm conhecimento deste instrumento.
Apesar de o fornecedor de bens ou prestador de serviços ser obrigado a possuir o LR nos seus estabelecimentos, muitos não o disponibilizam, os consumidores não denunciam pois existe um sentimento que nada será feito. Este sentimento poderia ser, facilmente, dissipado se a entidade competente divulgasse os prestadores de serviço e fornecedores de bens prevaricadores e as sancões aplicadas, no âmbito das denúncias. Não se pode alegar falta de conhecimento para não possuírem o LR, que é obrigatório por lei. O que a ADECO propõe para minimizar estas situações é que as Câmaras de Comércio, o governo e as próprias agências reguladoras ministrem formações para capacitar os prestadores de serviço e fornecedores de bens.
Em setembro de 2023, a ADECO enviou ao Ministério responsável pela área da defesa do consumidor, o Ministério da Presidência do Conselho de Ministros e dos Assuntos Parlamentares, uma proposta de alteração do Decreto-Lei nº 19/2008, de 9 de junho. Esta proposta prevê a simplificação do procedimento, bem como a criação e implementação do livro de reclamações digital. Estamos a aguardar o posicionamento do Ministério.
A regulação e a fiscalização deste instrumento é da competência da entidade de controlo de mercado ou da entidade reguladora do sector. O LR é composto por 25 folhas de reclamação em triplicado. Após o preenchimento da folha de reclamação, o prestador de serviços ou fornecedor de bens, na pessoa do funcionário do estabelecimento deve cumprir o seguinte procedimento:
- Retirar do LR o original que, no prazo de 10 dias úteis, deve ser remetido à entidade reguladora do sector.
- Entregar o duplicado da reclamação ao reclamante, conservando em seu poder o triplicado, que faz parte integrante do livro de reclamações e dele não pode ser retirado.
- O reclamante pode remeter o duplicado da folha de reclamação à entidade competente.
- Depois de uma análise, a entidade competente pode ou não penalizar o estabelecimento, conforme a lei assim o determinar.
A ADECO tem vindo a sensibilizar os consumidores a fazer reclamação no LR, mostrando a importância da sua utilização ao consumidor. Com os fracos recursos financeiros que dispõe tem sido a única instituição a fazer esta sensibilização de forma contínua. Algumas agências reguladoras fizeram também algumas ações de sensibilização, mas foram ações pontuais.
A sensibilização é feita através de conteúdos transmitidos nos programas de rádio e televisão produzidos pela ADECO, nas nossas redes sociais, e em muitas ações de sensibilização em comunidades e junto da Polícia Nacional em várias ilhas (instituição que também tem um papel importante quando se trata do LR). Convém esclarecer que o Estado de Cabo Verde é o primeiro responsável pela defesa dos direitos do consumidores e com mais recursos, a ADECO poderia realizar muitas mais ações de sensibilização. Recentemente a ADECO assinou um protocolo com a Chefia do Governo com o objetivo de sensibilizar os consumidores e fornecedores sobre a importância do LR.
Celebrar? Infelizmente ainda não! Mas estamos convictos que brevemente teremos motivos para celebrar, afinal o mercado fortalece quando a voz dos consumidores é ouvida e consumidores somos todos nós!
ADECO