Combate feroz às perdas de energia e aposta forte na eficiência energética e fontes de energia limpa para garantir a sustentabilidade do setor elétrico.

Os consumidores cabo-verdianos foram surpreendidos no início do ano novo com mais um aumento nas tarifas de eletricidade, unanimemente consideradas em níveis muito elevados. Concretamente, os custos aumentam em 2.12 escudos para os clientes da Electra e em 2.18 escudos para os consumidores na Boa Vista. Assim, os custos de eletricidade para os consumidores de baixa tensão fixam-se em:

É importante destacar que os consumidores da Boa Vista pagam recorrentemente as tarifas mais altas em Cabo Verde.

Vamos fazer uma simulação do aumento no custo mensal de eletricidade para dois clientes da Electra:

Os aumentos serão ainda maiores para aqueles que consomem acima desses valores.

Felizmente, as tarifas sociais de eletricidade mantêm-se inalteradas, o que se concidera uma medida acertada perante a fragilidade económica das famílias mais pobres de Cabo Verde. Contudo, é preciso continuar a fazer um trabalho no sentido de incluir mais famílias verdadeiramente carenciadas na tarifa social única. 

Mas, por que esse aumento? A Agência Reguladora das Tarifas (ARME) justifica os ajustes feitos para compensar a empresa Electra e AEB com os aumentos dos combustíveis. A produção de energia envolve diversos elementos, como instalações, máquinas, pessoas e, notavelmente, combustível, que é um dos principais responsáveis pelo custo da eletricidade. No entanto, é legítimo interpelar os decisores e atores do setor elétrico se o custo dos combustíveis justifica as tarifas de eletricidade tão elevadas que temos.

Apesar de os combustíveis terem um impacto no custo da eletricidade, duas medidas poderiam ser adotadas para reduzir esse impacto e, assim, ter custos mais baixos:

  1. Aumentar a produção de eletricidade através do vento e do sol.

 Cabo Verde precisa investir mais nessa área, pois nos últimos anos o investimento foi insuficiente ou mesmo escasso. Pelos dados disponíveis e segundo o relatório da ELECTRA, em 2013 as energias renováveis (sol e vento) representavam 19.9% na rede pública e em 2022 é só de 16.8%. Claramente nota-se uma falta de investimento sustentado e um recuo da aposta nas energias renováveis.  Pelo gráfico abaixo vemos que desde 2018 houve uma diminuição do peso das energias renováveis.

Fonte: Relatório da Electra, 2022

Quanto mais produzimos com energias renováveis, menos combustíveis são usados nas centrais e menor será o custo final da eletricidade pois produzir com energias renováveis em Cabo Verde é mais barato.

Também é preciso dizer que os consumidores devem ser incentivados a serem microprodutores de energia elétrica através da instalação de sistemas solar-fotovoltaico nos terraços e telhas das residências. A lei da Microgeração que enquadra esta atividade precisa ser desburocratizada e removida quaisquer barreiras que limitam a iniciativa dos consumidores em serem produtores da sua própria eletricidade renovável. Segundo estimativas (https://www.energiasrenovaveis.cv/) a microprodução gera anualmente 9.81 GWh de eletricidade, o qual se for contabilizado elevaria a taxa de penetração para 17.8%, mas ainda abaixo do nível registado quase 10 anos atrás.

  1. Utilizar combustíveis mais econômicos em algumas centrais, como no Fogo, Santo Antão e Sal.

As empresas produtoras de eletricidade podem aprimorar a eficiência energética nesse aspecto. Segundo dados da Electra, as novas centrais do Fogo e da Brava, que foram dimensionadas para usar combustível mais barato (Fuel 180 cSt) continuam a queimar o gasóleo, o que no final do ano representa mais custo para a empresa. Na ilha do Sal a empresa tem alugado grupos a terceiros para produzir uma parte da sua energia elétrica usando gasóleo. Estas ineficiências na gestão e operação constituem custos que não contribuem para um abaixamento de tarifas, mas para o seu agravamento.

Perdas de Eletricidade – o pesadelo do setor elétrico

Um dos fatores que mais contribui para o nível de tarifas elevadas que temos são as perdas de eletricidade. O país não tem conseguido ganhos significativos nesta matéria. Em 2013 as perdas na rede da Electra eram de 26.9% e passados 9 anos é de 24.4% em 2022, o que mostra o falhanço que tem sido as tentativas de as diminuir. Há que se destacar que 24.4% de perdas em 2022 representam muito mais energia perdida em termos absolutos que 26.9% em 2013: as perdas absolutas de eletricidade cresceram 260% em 9 anos.  As perdas de eletricidade suplantam o que as ilhas de São Vicente, Santo Antão, São Nicolau e Brava produzem de eletricidade juntas.  Embora as promessas de diminuir as perdas continuam, a persistência destas faz qcom que tenhamos uma empresa de energia tecnicamente falida – em 2022 acumulou um prejuízo de 782.000 contos. Esse prejuízo é coberto pelas tarifas excessivamente altas e pelos impostos dos cidadãos, que são os que garantem a sustentabilidade dos serviços públicos, mas a um custo elevadíssimo. O papel do regulador em querer salvaguardar o equilíbrio económico-financeiro dos operadores é irrisório e irrelevante.

É de extrema importância que os consumidores exijam uma resposta rápida e eficaz para este problema. Somente assim poderemos ter um serviço de fornecimento de eletricidade de qualidade e com custos razoáveis para a população em geral.

Eng. Marco Cruz,

 Membro Direção ADECO